quarta-feira, 25 de julho de 2007

Viúva de Prestes conta por que foi ao jantar do PCdoB

http://www.vermelho.org.br/base.asp?texto=21972 acesso em 25 jul. 2007.

Maria Prestes, viúva de Luiz Carlos Prestes, surpreendeu os organizadores do jantar da Campanha da Sede Própria do PCdoB no Rio de Janeiro, em 18 de junho último, ao comparecer espontaneamente ao evento. ''Considerei importante manifestar minha solidariedade para com os camaradas comunistas. Sempre que posso participo de reuniões e palestras realizadas pelo PCdoB e vou sem ser convidada. Fui ao jantar porque é importante o PCdoB ter a sua sede'', explica ela, nesta entrevista para Wevergton Brito. E pede para o PCdoB ''lembrar os passos de Prestes, até mesmo através das discórdias''.

Militante comunista desde a sua adolescência, Maria do Carmo Ribeiro, pernambucana, acompanhou a luta política de seu pai, João Rodrigues Sobral, nas fileiras do PCB, nos anos 30, 40 e 50. Conheceu a barbárie da ditadura do Estado Novo, que assassinou, torturou e desapareceu com milhares de comunistas e antifascistas. Viu Prestes pela primeira vez num comício em Recife, na Praça 13 de Maio, nos anos 40. Mas conheceu mesmo o Cavaleiro da Esperança quando foi designada pelo Comitê Central do PCB para ser responsável pela segurança do aparelho onde ele ficaria morando clandestinamente, no início dos anos 50.

Da convivência veio casamento e vieram os sete filhos: João, Rosa, Ermelinda, Luiz Carlos, Mariana, Zóia e Iuri. Prestes já tinha a filha Anita, fruto do casamento com a militante comunista alemã Olga Benário, e Maria tinha dois filhos do primeiro casamento, Pedro e Paulo. Hoje, da altura dos seus 77 anos, 22 netos e três bisnetos, ela continua firme, e, à sua maneira, contribui para a construção de um Brasil socialista.

Através das palestras que realiza, dos museus que cria para perpetuar a memória de Prestes e dos livros que escreveu sobre sua trajetória, ela passa a mensagem de que é preciso continuar lutando por um mundo sem exploração do homem pelo homem. Dona Maria gosta de recordar os anos de exílio em Moscou, União Soviética, quando toda família, pela primeira vez pôde viver unida e em paz. Residindo na Gávea, bairro da cidade do Rio de Janeiro, gosta muito de viajar, freqüentar teatros, cinemas, exposições e curtir as belezas da cidade maravilhosa. Especialmente as praias. Afirma: “Não existe cidade mais linda do que o Rio de Janeiro - claro que gosto do meu Recife natal”.


Pergunta - Sua presença e a de seu filho no jantar para arrecadação de recursos para compra de sede própria do PCdoB, trouxe alegria para o Partido. O que a motivou a ir?

Maria Prestes - Minha presença na festa do PCdoB foi porque o meu filho, Luiz Carlos, tinha convites. Considerei importante manifestar minha solidariedade para com os camaradas comunistas. Sempre que posso participo de reuniões e palestras realizadas pelo PCdoB e vou sem ser convidada. Penso que o exercício de analisar as propostas políticas atuais, ouvir as argumentações dos militantes me ajuda a ficar jovem.

Fui ao jantar porque é importante o PCdoB ter a sua sede, afinal é uma organização com representação no Congresso Nacional, nas Assembléias Legislativas e nas Câmaras Municipais das mais diferentes cidades do interior. Um endereço definitivo pode colaborar para que o pensamento marxista seja estudado mais e mais, servindo de ferramenta de luta para todos os explorados pelo capital financeiro nacional e internacional.

P - Como você começou sua vida de militante comunista?

Maria - Desde os meus dez anos comecei a participar, ao lado do meu pai, das reuniões do Partido Comunista Brasileiro na Bahia. Viajei com ele, e meu dois irmãos, por todo Norte/Nordeste realizando contatos clandestinos, levando orientação política do Comitê Central e as palavras de ordem.

Esta foi minha adolescência, sempre dentro do PCB, ouvindo as conversas de um Carlos Mariguela, de um Jorge Amado ou de um Gregório Bezerra. A solidariedade para com as famílias dos comunistas presos era uma atividade intensa. Durante o Estado Novo eram milhares de presos. Pouca gente fala sobre este tema hoje, é um tema pouco explorado na nossa historiografia, a barbárie de Getúlio Vargas nos anos 1935-1945.

Vivi, com meus olhos de menina, líderes assassinados, torturados e desaparecidos. Ao lado de meu pai, que era conhecido como Camarada Lima, lutei, distribuindo jornais e folhetos nas portas de fábricas. Participei da organização de comícios pela entrada do Brasil na 2ª Guerra Mundial, pela anistia dos presos políticos e pela legalização do Partido Comunista.

Foi uma glória a vitória da União Soviética, a URSS, sobre a Alemanha nazista. Imagina que hoje dizem que foram os americanos que venceram este último conflito mundial! Não quero desprezar a participação de todos os aliados, inclusive do Brasil, naquela guerra, mas foi o soldado soviético que venceu a Alemanha de Hitler.

P - Alguns dos seus filhos nasceram no exterior? Como foi cria-los no exílio?

Maria - Meus filhos nasceram nas cidades do Rio de Janeiro, São Paulo e Recife.Todos eles são brasileiros. Agora, dos meus 22 netos 15 nasceram no exílio. Já tenho três bisnetos, dois são brasileiros e um nasceu na Rússia.

Quando falo dos meus filhos gosto de destacar a alegria que sinto por eles terem se formado na ex-União Soviética. Claro que o socialismo real da Rússia, que durou entre os anos de 1917-1990, não foi um mundo cor-de-rosa. Porém, não posso deixar de reconhecer que foi lá que minha família viveu os anos mais tranqüilos e felizes, todos juntos.

Tivemos a oportunidade de conhecer as culturas das repúblicas soviéticas: da Geórgia, do Azerbaijão, da Bielorússia, Ucrânia, Uzbequistão, Cazaquistão, Estônia ou Lituânia. Viajamos pelos países socialistas: Bulgária, Romênia, Polônia, Alemanha Democrática, Hungria ou Iugoslávia. Países que tinham um sistema político socialista que não existe mais. Foi o exílio que nos possibilitou conhecer estes recantos. Não posso esquecer das visitas as fábricas, cooperativas agrícolas, escolas, museus, teatros e, especialmente, às casas dos amigos.

A experiência socialista, vivida por estes povos, foi muito importante. Com o passar dos anos os erros serão avaliados de maneira mais ponderada. Estes povos saberão reconhecer o quando devem ao sistema socialista pelos avanços nas áreas de educação, ciência e infra-estrutura. Meus filhos se formaram aprendendo marxismo, estudado economia política. O exemplo da luta revolucionária de Lênin, de Fidel Castro ou de Ho-Chi-Min está dentro deles.

P - O PCB apoiava o Governo Jango Goulart e acreditou que poderia mudar o país através dele?

Maria - O Governo do presidente Jango não tinha proposta de realizar uma revolução socialista, isso os comunistas sabiam. E, que fique bem claro, os comunistas não acreditam, os comunistas tem convicções.

Mas, o apoio, do qual você está falando, se deu por conta da necessidade que existia em consolidar o regime de estado de direito no Brasil dos anos 60. O PCB apoiou este governo democrático porque Jango defendia a liberdade de organização dos partidos políticos, defendia a luta por melhores salários para os trabalhadores e desejava que os processos eleitorais não tivessem interferências de militares. Continuo com a opinião de que estávamos certos. O golpe militar de 1964 fez o país viver uma ruptura do processo político, trouxe o atraso, a decadência que contaminou todas as esferas da vida política atual.

P - Como você vê o legado de Prestes? Sua memória e seu exemplo são valorizados? Se não, o que fazer para que as novas gerações conheçam Prestes?

Maria - O legado de Luiz Carlos Prestes, o Cavaleiro da Esperança do povo brasileiro, tem importância fundamental nos dias de hoje. Ele é o exemplo de um homem de caráter firme, de personalidade estóica, de coragem destemida. E, especialmente, uma pessoa incorruptível. Sua trajetória de revolucionário - marcada pela marcha da Coluna Prestes e pelo Levante Antifascista de 1935 é uma trajetória de herói.

Quem sempre fala desta maneira é o nosso maior amigo, Oscar Niemeyer. Considero estranho o PCdoB nunca ter feito uma homenagem para Prestes. O Brasil é maior do que as vaidades e os interesses partidários imediatos. Quem sabe não chegou a hora de lembrar os passos de Prestes, até mesmo através das discórdias.

Juntamente com meu filho, Luiz Carlos, criei os Memoriais Coluna Prestes nas cidades de Santo Ângelo (RS), Santa Helena (PR), Palmas (TO) e Crateús (CE). Batizamos, com nome de Prestes, rodovias e praças nas cidades de São Paulo, Rio de Janeiro, Distrito Federal e São Miguel, (RN). Nunca o PCdoB enviou uma mensagem de parabéns.

Penso que os comunistas devem saber valorizar os heróis comunistas, independente de qualquer questão. Já que estamos falando de homenagens... penso que devemos nos juntar apara lutar pela memória dos comunistas que morreram nos porões da ditadura militar: David Capistrano, Itair José Veloso, José Montenegro de Lima, Luis Maranhão e Orlando Bomfin. Você deve concordar que pouco importa hoje deles terem pertencido ao PCB. Não é verdade?

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